Marcos Mendes

Pesquisador associado do Insper, é organizador do livro 'Para não esquecer: políticas públicas que empobrecem o Brasil'

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O choque de preços de combustíveis

Custos da mitigação de alta de preços tendem a superar os seus benefícios

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A invasão da Ucrânia gerou um choque no preço do petróleo. Executivo e Congresso avançam com mecanismos para suavizar o impacto. As propostas têm custo em aberto, e podem superar R$ 50 bilhões (0,6% do PIB de 2021) se adotadas de forma ampla e por tempo mais longo.

A predisposição para intervenção estatal que vemos no Brasil não parece ter paralelo em outros países. Uma consulta à internet mostra alguns casos de subsídios e redução de tributos de custo restrito. Nas Filipinas, por exemplo, benefícios focalizados de 0,02% do PIB. Em Portugal, voucher a consumidores e redução de impostos custando 0,07% do PIB. Bem menos que as cifras brasileiras.

Pode-se argumentar que o Brasil é um país produtor de petróleo, e que o governo tem ganho de receitas com o aumento dos preços (royalties, dividendos da Petrobras, impostos). Por isso, parte do ganho fiscal poderia ser gasto para suavizar o aumento de preços, sem piorar a situação fiscal.

Funcionário faz alteração de preços em posto em São Paulo - Rivaldo Gomes - 10.mar.2022/Folhapress

Contudo, o que se vê em outros grandes produtores mundiais que têm economia de mercado, como Canadá, Noruega e EUA, é a resignação com preços mais altos. Afora algumas medidas localizadas (redução de tributos provinciais em Alberta, Canadá), não há esquema amplo de mitigação do choque. A razão disso é que os benefícios da intervenção tendem a ser menores que os custos diretos (fiscal) e indiretos (desestímulo ao investimento na prospecção, risco de desabastecimento, concentração de renda e má alocação de recursos).

A mobilização que existe no Brasil é de natureza política: eleições, temor de greve de caminhoneiros, tradição intervencionista, fragmentação do poder decisório. Resta avaliar as opções sobre a mesa.
A opção mais nociva é o fim da paridade com o preço internacional do petróleo. Ela está no discurso de vários candidatos e foi incluída –de forma pouco clara– no PL 1472, aprovado no Senado na última quinta-feira. Trata-se de interferir no processo de decisão da Petrobras e de seus competidores. Acabará levando à reestatização da companhia e à saída das empresas privadas do mercado. Reconvertida em repartição pública, a Petrobras perderá a injeção de capital privado que alavanca seus investimentos, terá menos incentivos concorrenciais para pesquisar, além de ser loteada entre políticos. Suas reservas cairão, empobrecendo o país. O México escolheu esse caminho, e vem pagando custo alto.

Igualmente ruim é a criação de fundo de estabilização de preços. Esse é o cerne do PL 1472. A ideia pressupõe que os preços oscilem em torno de uma média, de modo que nos períodos de alta o fundo subsidia o combustível e nos de baixa o preço não cai proporcionalmente, gerando recursos para capitalizar o fundo. O problema é que os preços podem passar por períodos muito longos de alta, gerando forte custo fiscal; ou de baixa, levando a excesso de capitalização, que incentiva o uso dos recursos excedentes para subsidiar combustíveis em momentos em que eles já estão baratos. Masami Kojima (Fossil fuel subsidies and pricing policy) mostra que o fundo não funcionou nos países em que foi adotado. A ideia vem sendo abandonada.

Opção menos pior seria um subsídio somente para o diesel, com custo fiscal máximo previamente definido, nos moldes do que se fez em resposta à greve dos caminhoneiros, em 2018. Mesmo assim, são muitas as distorções geradas, como mostrei em texto publicado em outro veículo (disponível mediante solicitação).

Por fim, há a redução temporária de tributos sobre o diesel, aprovada no PLP 11/20 e enviada a sanção. Tem alto custo fiscal e efeitos os colaterais negativos acima citados, mas a implementação é mais simples que a do subsídio.

Deve-se aproveitar a mobilização em torno do tema para adotar medidas na direção correta. Por exemplo, coibir abusos de poder de mercado da Petrobras, via CADE, ou exigir transparência nos critérios de cálculo do preço de paridade, via ANP. A privatização de refinarias e o fim de privilégios à estatal, como o direito de preferência na escolha de campos de petróleo em licitação, aumentariam a competição ajudando a regular preços.

Políticas públicas que encarecem fretes e combustíveis devem ser revogadas, como é o caso do Adicional de Frete da Marinha Mercante e o mal desenhado Programa Renovabio. A volatilidade dos preços pode ser mitigada com a mudança da incidência do ICMS, essa última encaminhada no PLP 11/20, mas pendente de regulamentação pelos estados.

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