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 Opinião | Roda da indústria 

VW Tarok: o adeus definitivo da picape que nunca foi?

Fabricante vai repetindo com ela a saga do Taigun, outro conceito brasileiro que gerou muita expectativa e nunca saiu do papel

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Leonardo Felix
  • 06/05/2022 - 14:17
  • 3 minutos de leitura

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    Houve um tempo, não muito atrás, em que a Volkswagen parecia perdida com as mudanças de rumo do mercado brasileiro. Modelos caros e deslocados de suas propostas, como o Up!, além da aposta na produção local de produtos como o Golf 1.6 MSI e o Jetta 1.4 TSI (você se lembrava que a VW chegou a montá-lo localmente?). Dias estranhos.

    Foi mais ou menos nesse período que a companhia apresentou, no Salão do Automóvel de São Paulo de 2012, o Taigun, conceito de um pequeno SUV com menos de 4 metros de comprimento derivado do Up!. Muitos anos e muita expectativa depois, o modelo jamais saiu do papel, corroborando que a empresa parecia um tanto perdida estrategicamente.

    Veio a acertadíssima decisão de trazer para cá a plataforma MQB e tudo mudou. A marca alemã foi extremamente assertiva nas estratégias de lançamento de Polo, Virtus, T-Cross e até o Nivus, inclusive no posicionamento de preços desses modelos. Tudo parecia muito bem encaminhado.

    Depois deles, viriam o Taos (projeto VW316), em 2021, o projeto VW246 – SUV pequeno como substituto do Gol, em 2022 –, a Tarok (projeto VW317) em 2023 e o VW247 (picape compacta sucessora da Saveiro) em 2024. Todos nascidos a partir das matrizes MQB A0 (produção no Brasil) ou MQB A (Argentina). Fora a segunda geração da Amarok, derivada da nova Ford Ranger. Tudo lindo e promissor.

    Mas aí veio a pandemia e revirou o planejamento da empresa de cabeça para baixo. Acordos com sindicatos vieram, ajustes foram feitos – surgiu, por exemplo, o Polo Track, um projeto improvisado para ter um novo carro de entrada para o lugar do Gol sem tantos investimentos – e tudo parecia novamente nos trilhos.

    Uma nova crise, uma nova revisão na estratégia

    Surgiu então outra crise, a dos semicondutores e de fornecimento de matérias-primas, agravada recentemente pela guerra entre Rússia e Ucrânia. E se a GM foi a maior afetada por isso em 2021, neste ano é a VW que mais sofre. 

    Tirando T-Cross e Nivus, seus demais modelos sumiram do ranking de emplacamentos em abril de 2022, fazendo a marca amargar um sexto lugar de participação, atrás de Hyundai, Toyota e até da Jeep, que atua no país, na prática, com meros três modelos. 

    Os preços de seus carros voltaram a ficar estranhamente acima de qualquer lógica (como pode um Gol chegar a R$ 85.000 quando um Mobi e um Kwid não passam de R$ 70.000, ou uma Saveiro manual custar os mesmos R$ 120.000 de uma Strada automática?), e a capacidade de planejamento e investimento se encontra novamente afetada.

    E aí, em vez de anunciar a produção da novíssima Tarok na Argentina, o que todos esperavam, ou mesmo um retorno do projeto de segunda geração da Amarok em parceria com a Ford, a fabricante mudou tudo e resolveu aplicar US$ 250 milhões, entre outros projetos, para esticar a vida da Amarok de primeira geração. Por mais dez anos! Uma picape surgida em 2012, o que significa que terá um ciclo de 22 anos de vida na América do Sul.

    A Tarok, lembremos, foi um conceito de picape compacta-média, aos moldes da Fiat Toro e menor que a Amarok, apresentado no Salão de SP de 2018. Já faz quase quatro anos. O momento era de já tê-la praticamente pronta para o lançamento.

    Se tempo para tirá-la do papel não faltou, a indecisão a respeito de sua produção fez com que ela passasse de potencial primeira rival da Toro a um produto que, se vier, chegará já atrasada em relação a outras concorrentes.

    Concorrente que nunca existiu?

    Rememoremos, ainda, que a Tarok usaria como base estrutural a carroceria do Taos, que é produzido também na Argentina. Ou seja, faria total sentido fabricá-la em General Pacheco junto com o SUV compacto-médio, de quem herdaria diversos componentes.

    Com o anúncio da VW, que já avisou que este ciclo de US$ 250 milhões em solo Hermano se estende até 2026 – só a renovação da Amarok levará dois anos para ser apresentada de fato –, podemos afirmar com certa tranquilidade que as portas para a Tarok se fecharam. Pelo menos no país vizinho.

    A esperança é que a fabricante tenha reservado um espaço para ela em São José dos Pinhais (PR), e que ela ainda seja um dos quatro novos modelos construídos sobre a base MQB que a marca prometeu lançar no Brasil até 2026. Se não for o caso, desta vez o adeus é definitivo. 

    Assim como o Taigun morreu como o famoso SUV de entrada que nunca nasceu, a Tarok terá sido a famosa rival da Toro que nunca existiu. E a VW terá voltado aos estranhos tempos de decisões e caminhos que parecem não fazer muito sentido.


    Leonardo Felix é jornalista especializado na área automobilística há 10 anos. Com passagens por UOL Carros, Quatro Rodas e, agora, como editor-chefe da Mobiauto, adora analisar e apurar os movimentos das fabricantes instaladas no país para antecipar tendências e futuros lançamentos.

    *Este texto traz a opinião do autor e não reflete, necessariamente, o posicionamento editorial de Automotive Business