Reforma tributária só terá impacto no crescimento do Brasil se for ampla, afirma Armando Monteiro

Conselheiro da CNI participou de debate com parlamentares e especialistas sobre a necessidade de um sistema tributário mais justo para reverter a estagnação da indústria, gerar emprego e desenvolvimento

O sistema tributário brasileiro é o responsável pela baixa competitividade do país, pelo quadro de estagnação da economia e pela perda da posição relativa da indústria no Produto Interno Bruto (PIB) nacional. Diante disso, somente uma reforma tributária ampla, que inclua os impostos cobrados pela União, estados e municípios, será capaz de fazer o Brasil crescer, gerar emprego, renda e desenvolvimento. Se for fatiada, a reforma terá pouquíssimo efeito. Essa é a avaliação do conselheiro emérito da Confederação Nacional da Indústria (CNI), o ex-senador e industrial Armando Monteiro Neto.

Ele participou do seminário online, nesta terça-feira (8/6), promovido pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) e pelo jornal Correio Braziliense, para discutir a importância de uma reforma tributária ampla, em conjunto com o presidente da Comissão Mista de Reforma Tributária, senador Roberto Rocha (PSDB-MA), os deputados Alexis Fonteyne (NOVO-SP) e Ricardo Barros (PP-PR), líder do Governo na Câmara dos Deputados, a professora e consultora especialista em IVA/IBS Melina Rocha e o diretor do Centro de Cidadania Fiscal, economista Bernard Appy. O debate foi mediado pelo jornalista Vicente Nunes, editor-executivo do Correio Braziliense.

Na avaliação de Armando Monteiro, o imposto cobrado nos municípios, ISS, e o cobrado pelos estados, ICMS, são responsáveis por dois terços dos tributos na base de consumo. Desta forma, segundo ele, é necessário que se crie um Imposto sobre Valor Agregado (IVA) que substitua os cinco tributos de consumo: PIS/Cofins e IPI (federais), ICMS (estadual), ISS (municipal).

Atualmente, o acordo pela tramitação da reforma prevê, inicialmente, a união apenas de PIS e Cofins, deixando a discussão sobre os demais tributos para depois. “O IVA está presente em 160 países, o Brasil amadureceu e superou fórmulas exóticas para convergir para um sistema tributário que hoje vigora no mundo inteiro. Por isso é fundamental que faça uma reforma ampla, mais ambiciosa, e não fatiada”, defendeu. 

Para o ex-senador, o Brasil tem pressa e não pode perder a oportunidade de construir um sistema tributário com bases internacionais. Ele lembra, por exemplo, que o sistema tributário caótico é responsável pelo custo de instalação de uma siderúrgica no Brasil ser 10% mais caro do que no México, por exemplo, conforme estimou um estudo realizado pela consultoria Ernest Young para a CNI.


“Há um ambiente político favorável à votação e à aprovação de uma reforma ampla, com um inédito consenso na esfera federativa”, afirmou Armando Monteiro.


“Mas a reforma não avançará se o governo federal não se colocar dentro da reforma. Mesmo com passo inicial de fusão do PIS/Confins, é preciso ter uma reforma ampla, do contrário, o governo pode até dizer que fez alguma coisa, mas o impacto será muito pequeno”, acrescentou.

É possível conciliar reforma ampla com unificação do PIS/Cofins

De acordo com o presidente da Comissão Mista de Reforma Tributária no Congresso Nacional, senador Roberto Rocha, é importante olhar que “o copo está meio cheio”, com o retorno do diálogo entre o Executivo e o Legislativo. Ele diz que há alguns consensos para uma reforma tributária ampla, tais como: crédito financeiro, tratamento diferenciado para saúde e educação, preservação do Simples e da Zona Franca de Manaus, cobrança no destino.

Mas que a estratégia do governo foi retirar as propostas em que não se tem consenso, como o Fundo de Desenvolvimento Regional, para compensar a perda de arrecadação dos estados com o fim da guerra fiscal. Como a reforma tributária ampla acaba com o ICMS, os governos estaduais não poderão mais fazer renúncias fiscais para atrair investimentos, em detrimento de outro estado. 

Roberto Rocha afirmou que, em breve, vai entregar o relatório da PEC 110, que trata da criação do IVA dual – um imposto valor agregado federal e outro estadual – que está sendo feito em parceria com a Câmara dos Deputados e o governo.  “Eu tenho consciência que essa é a maior obra social que podemos fazer, mas nada será feito se não for combinado. O jogo combinado dentro do Congresso já não é fácil”, explicou.


Segundo o senador, a ideia é aprovar a unificação do PIS/Cofins, por projeto de lei, e que deve criar a Contribuição de Bens e Serviços (CBS), e depois a CBS passaria a integrar o IVA federal, imposto que seria criado a partir da unificação dos impostos federais. “É perfeitamente conciliar a aprovação da CBS por lei ordinária, com reforma ampla”, disse o senador. 


Na contramão do entendimento dos especialistas, o líder do governo na Câmara, deputado Ricardo Barros, afirmou que “a reforma tributária será votada de forma fatiada, provavelmente em quatro etapas, começando pela CBS, que será a fusão do PIS e Confins. Ele afirma que só foi possível votar a reforma previdenciária, porque havia um problema visível, com a falta de capacidade dos estados em pagar as folhas de pagamento. 


Para Barros, líder do governo na Câmara, a reforma tributária será votada em etapas


“O problema se materializou naquele momento. Agora, eu não estou vendo essa união e vontade dos Estados. O ICMS é importante, a disputa está nisso. O discurso é um e a prática é outra. Falta uma manifestação mais clara de estados e municípios de que querem participar a solução geral do sistema tributário brasileiro”, afirmou o líder do governo. 

Reveja o debate

Reforma tributária ampla é ter visão sistêmica do país

O deputado Alexis Fonteyne afirmou que a reforma tributária pode ser faseada, mas não fatiada.


“Não dá para fazer reforma com puxadinhos. De puxadinho basta o que temos hoje”, disse Fonteyne.


Segundo ele, falta visão sistêmica de que o Brasil é o único país do mundo que tem um sistema disfuncional, no qual quem paga mais imposto é o mais pobre.

Fonteyne lembra que o empresário brasileiro é obrigado a usar 1,5 mil horas para pagar as obrigações acessórias e que os temas tributários consomem entre R$ 240 bilhões e R$ 280 bilhões por ano, que acabam refletindo no preço do produto e do serviço. “O contencioso na Justiça, causado por esse monte de alíquotas, é riqueza que não está circulando. O recurso sai do balanço das empresas e a Receita não pode usar”, afirmou.

 

O parlamentar afirmou também que a reforma tributária tem um impacto social muito grande “Ela reflete no emprego, pois se hoje a indústria não tem competitividade, nós trazemos produto de fora. Se vem de fora, não gera emprego aqui. Se a indústria deixar de existir quem vai pagar essa conta? O objetivo fazer a reforma tributária para subir a barra da renda da população com base na produção, inclusão social produtiva”, defendeu.

Especialistas defendem reforma tributária ampla

Em sua fala, a professora e diretora de cursos da Universidade Iorque, no Canadá, Melina Rocha Lukic, afirmou que decisões recentes do Supremo Tribunal Federal (STF) vão afetar diretamente a arrecadação, como, por exemplo, a exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS/Confins. Segundo ela, apenas isso já deveria ser suficiente para garantir o apoio dos governadores para uma reforma ampla. 


“Reforma em etapas não é reforma fatiada. Mesmo no IVA dual, é importante ter um modelo inteiramente colocado, com um plano e um caminho a seguir. O governo federal não quer entrar nessa discussão, o que está na mesa é a unificação do PIS/Cofins, por meio de projeto de lei. Mas temos que tomar cuidado com isso, para não passar a CBS de forma desconectada. Senão, ao final, vamos ter problema de ter dois tributos completamente diferente”, explicou Melina Rocha Lukic. 


Além de professora, Melina é doutora em Direito e Ciência Política pela Universidade Sorbonne Nouvelle – Paris III, na França, e autora do livro Reforma Tributária no Brasil – ideias, interesses e instituições.

De acordo com o economista Bernard Appy, o ambiente para aprovação de uma reforma tributária ampla é o mais favorável das últimas décadas. “Os estados estão apoiando de forma unânime uma reforma que acabe com o ICMS, com cobrança no destino. É verdade que temos algumas resistências de grandes municípios, que querem manter o ISS, mas a grande questão é de custo-benefício. Eles olham para a situação deles e esquecem de olhar para o País”, afirmou.


"Sistema atual penaliza a indústria e favorece um setor de serviços de baixa produtividade", afirma Bernard Appy


Bernard Appy citou estudo do economista-sênior do LCA Consultores, Bráulio Borges, segundo o qual a realização de uma reforma tributária ampla possibilitaria um aumento de 20% do PIB brasileira no período de 15 anos. “O sistema tributário brasileiro penaliza a indústria e favorece um setor de serviços de baixa produtividade. O resultado é que os brasileiros são mais pobres ”, concluiu Appy.

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