Descrição de chapéu inflação

Inflação em alta e renda em queda levam Pão de Açúcar a quase zerar lucro no 2º trimestre

Rede culpa base de comparação desfavorável pelo resultado; início da pandemia foi melhor período da história para o setor

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Brasília

A derrapada no lucro do segundo maior varejista alimentar do país, o Grupo Pão de Açúcar (GPA), acendeu o alerta para a combinação entre renda da população em queda e inflação de alimentos em alta.

A rede varejista apresentou recuo de 95,9% no lucro líquido no segundo trimestre na comparação com o igual período de 2020, atingindo R$ 4 milhões.

De acordo com a companhia, controlada pelo francês Casino, o principal motivo foi a forte base de comparação com o segundo trimestre do ano passado: no período que marcou o início da pandemia no Brasil, a quarentena foi mais severa e apenas o comércio essencial permaneceu aberto. Com restaurantes fechados, funcionando apenas por delivery, os supermercados venderam alimentos como nunca.

“Mas isso não explica tudo”, diz o especialista em varejo Alberto Serrentino, sócio da Varese Retail. “A base de comparação é, sim, muito alta e muito atípica, e dificilmente um momento tão bom para o varejo alimentar como foi o segundo trimestre do ano passado vai se repetir na história”, afirma.

Cerca de 45% do consumo de alimentos era fora do lar antes da pandemia, mas 80% disso migrou para dentro de casa nos primeiros meses de isolamento, diz Serrentino. Os varejistas faturaram como nunca porque nem precisavam fazer promoção, afirma.

Lucro do Grupo Pão de Açúcar despencou no segundo trimestre de 2021 - Rubens Cavallari/Folhapress

Ao mesmo tempo, o auxílio emergencial, no valor de R$ 600 na época, garantiu o poder de compra do cliente da base da pirâmide. Neste segundo trimestre, porém, o auxílio foi reduzido a uma faixa de R$ 150 a R$ 375, e a classe média voltou a consumir fora de casa, a julgar pelo aumento das vendas do food service, diz.

Acontece que quase dois terços da receita bruta do GPA (62%) vêm de bandeiras populares, como Extra e CompreBem. “Este público sentiu muito mais a queda na renda e a inflação no preço dos alimentos”, diz Serrentino. O cliente começa a reduzir o consumo ou a trocar a marca por uma mais barata, explica.

Daniela Eiger, analista de varejo da XP, concorda. “Os clientes começam a buscar marcas mais baratas e, muitas vezes, acabam partindo para o atacarejo”, diz ela, referindo-se ao modelo de loja em que o consumidor compra com desconto se levar mais produtos.

O Assaí era a bandeira de atacarejo do GPA até dezembro, quando o grupo anunciou a cisão da empresa. Em 1º de março deste ano, o Assaí estreou na B3. Diferentemente do ex-controlador, no segundo trimestre deste ano, o Assaí registrou aumento de 62% no lucro líquido, para R$ 305 milhões, e alta de 22% na receita líquida, para R$ 10 bilhões. Os resultados do GPA não consideram o Assaí.

Em teleconferência com analistas nesta quinta-feira (29) para comentar os resultados, o presidente do GPA, Jorge Faiçal, afirmou que o “sofrimento de vendas” do Pão de Açúcar no período foi pontual e que “o principal motivo da queda neste trimestre foi evasão de consumidores que estão buscando locais mais baratos. "Vemos melhoria macroeconômica gradual no país nos próximos trimestres e o Pão de Açúcar, com a recuperação da renda e redução do desemprego, vai voltar a crescer", disse.

Eiger destaca que o grupo tem procurado reagir, com o aumento da venda de marcas próprias mais baratas (que representaram 21,5% da venda de alimentos no segundo trimestre, contra 20,9% do primeiro). Mas houve queda de 12,26% no critério vendas mesmas lojas na comparação anual, um recuo maior que os 11,4% registrados pelo concorrente e líder do varejo alimentar, o Carrefour.

A recomendação da XP para as ações do grupo é neutra e o preço-alvo para a ação é de R$ 39. No fechamento de quinta, o papel da empresa (PCAR3) respondeu pela maior queda do pregão na bolsa: recuo de 7,4%, para R$ 31,42.

Durante a teleconferência, Faiçal destacou que o grupo está remodelando a marca Extra, com redução do preço dos produtos. A nova proposta aproxima o Extra do modelo de atacarejo, o que poderia canibalizar a operação do Assaí, segundo especialistas. Faiçal afirmou, porém, que o objetivo não é transformar a bandeira em atacarejo.

“A classe média começou a comprar nos atacarejos e o GPA está atento a este movimento”, diz Eugênio Foganholo, sócio da Mixxer Desenvolvimento Empresarial. Para o consultor, o modelo proposto para o Extra pode ajudar o modelo de hipermercado, que perdeu espaço no varejo brasileiro. “A aposta no ‘hard discount’ pode ajudar dar uma sobrevida ao canal”, afirma.

“A bandeira Pão de Açúcar é voltada para um público mais elitizado, enquanto o formato de proximidade, com as lojas de vizinhança, garante espaço na preferência do público por comodidade. Mas o hipermercado precisa mesmo se reinventar e talvez este seja o caminho”, diz Foganholo.

Fabiano Vaz, sócio da Nord Research, destaca que a empresa conseguiu aliviar em parte a queda nas vendas com recuo nas despesas com vendas, gerais e administrativas, que atingiu 13,4% no segundo trimestre.

“A empresa conseguiu renegociar com a Península, dona da maioria das lojas do grupo, uma cláusula do contrato que a impedia de repassar os pontos a terceiros”, diz Vaz. A alternativa foi buscada para o fechamento de lojas próximas.

No segundo trimestre de 2020, a receita líquida do grupo, que engloba a operação do Éxito na Colômbia, Argentina e Uruguai, somou R$ 11,879 bilhões, queda de 5,3% ano a ano. Mas este movimento foi puxado pelo Brasil, onde o recuo no indicador foi de 9,7%. Já as vendas no exterior subiram 1,3%, com o bom desempenho da Argentina aliviando recuos na Colômbia e no Uruguai.

O resultado operacional medido pelo lucro antes de impostos, juros, amortização e depreciação (Ebitda) somou R$ 899 milhões, recuo de 7,7% na comparação anual. A margem Ebitda caiu 0,2 ponto percentual, para 7,6%.

Para justificar o desempenho aquém das expectativas, o Pão de Açúcar citou decretos locais que teriam obrigado a empresa a fechar lojas e reduzir horários de funcionamento, além de restrições a itens não essenciais, como bebidas alcoólicas e eletroeletrônicos.

Com Reuters

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.