Samuel Pessôa

Pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (FGV) e da Julius Baer Family Office (JBFO). É doutor em economia pela USP.

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Samuel Pessôa

Condições para ciclo de crescimento

Ajuste fiscal é necessário para que inflação não coma a desvalorização do câmbio

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Desde 2015 a economia brasileira processa um longo ajustamento macroeconômico. Esse período ainda inconcluso apresenta muitas semelhanças com o longo ajuste ocorrido entre 1997 e 2004. Em sete anos, foram construídas as condições que propiciaram o período muito positivo vivido nos dois mandatos do presidente Lula.

Vale repassar os números do ajustamento de 1997 até 2004. Em seguida podemos comparar com o atual.
Houve naquele primeiro período ajuste fiscal de quatro pontos percentuais do PIB (déficit primário de 1% do PIB em 1997 e superávit de 3% do PIB em 2005). O dado que empreguei foi o déficit primário do setor público consolidado, ajustado ao ciclo econômico, considerando receitas e despesas recorrentes. Série calculada pelo meu colega do Ibre Bráulio Borges.

O ajustamento fiscal foi acompanhado de ajuste nas exportações líquidas de sete pontos percentuais do PIB (déficit de 3% do PIB em 1997 e superávit de 4% em 2004). Dados das contas nacionais trimestrais a preços de 1995, divulgados pelo IBGE.

Cédulas de dólar e real
Cédulas de dólar e real; ajuste fiscal é necessário para que inflação não coma a desvalorização do câmbio - Gabriel Cabral/Folhapress

Compatível com o ajuste externo, houve forte desvalorização do câmbio. Controlando-se pelos termos de troca, o câmbio real desvalorizou-se em 35%. Os salários, portanto, caíram no período 17%, segundo o IBGE.

Esse brutal ajuste macroeconômico melhorou a lucratividade das empresas e explica, em parte ao menos, o bom período que tivemos nos anos subsequentes. Evidentemente, parte do crescimento é fruto do boom de commodities. No entanto, os números que levantei sugerem que há exagero em colocar todo o bom desempenho de nossa economia naquele período na conta do choque externo positivo. Fizemos também uma bela lição de casa.

Relatório recente do professor Carlos Rocca documenta que a rentabilidade das empresas tem melhorado muito nos últimos anos. Por exemplo, a geração de caixa das empresas, como proporção do faturamento, está em 20%, acima dos 19% de 2010 e dos 15% do vale de 2015.

A maior rentabilidade das empresas está associada à queda dos salários. Meu colega Daniel Duque, em post no Blog do Ibre, mostra que os salários caíram 13% entre 2014 e 2021.

Entre 2014 e 2020, o resultado primário do setor público consolidado, ajustado ao ciclo econômico e somente considerando receitas e despesas recorrentes, melhorou em 1,3 ponto percentual do PIB (déficit de 1,2% do PIB em 2014 e superávit de 0,1% do PIB em 2020).

No mesmo período, as exportações líquidas subiram de -3,7% do PIB para 0,8%, uma melhora de 4,5 pontos percentuais do PIB. Evidentemente, o câmbio ajustou-se e, controlando-se pela variação dos termos de troca, houve desvalorização de 64%.

Se olharmos os dois períodos, a dimensão na qual há maior diferença entre os dois ajustes é na política fiscal. No período atual, percorremos aproximadamente 1/3 do caminho. Restam ainda uns 2,5 pontos percentuais do PIB de melhora fiscal a fazer.

O ajuste fiscal é a condição para que a fortíssima desvalorização do câmbio que temos testemunhado não seja comida pela aceleração generalizada da inflação.

O(a) próximo(a) presidente, se fizer esse ajuste, colherá um longo ciclo de crescimento, como Lula colheu. Vale lembrar que, segundo os cálculos de Bráulio Borges, nos primeiros dois anos do governo Lula houve ajuste fiscal de um ponto percentual do PIB.

A lição de casa que caberá ao próximo presidente ficou mais difícil, em comparação ao primeiro governo Lula, mas não impossível, diante de nossas experiências de ajuste fiscal.

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