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Anfavea joga previsões para baixo

Sem produção suficiente para atender toda a demanda, entidade traça dois cenários, ambos com redução das expectativas de vendas e exportações

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Pedro Kutney
  • 06/10/2021 - 15:58
  • | Atualizado há 2 anos, 6 meses
  • 4 minutos de leitura

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    A Anfavea “jogou a toalha”, admite que não vai conseguir vencer este ano a luta contra falta de componentes e problemas logísticos que estão paralisando ou reduzindo o ritmo das fábricas de veículos. Diante do volume de produção insuficiente para atender a demanda dos mercados interno e externos, a associação que representa os fabricantes instalados no País traçou dois cenários possíveis para o fechamento de 2021, ambos com revisão para baixo das previsões, reajustadas pela última vez em julho e agora definitivamente rebaixadas.


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    No cenário chamado de “menos pessimista”, calculado com a esperança de que as montadoras vão desviar dos problemas logísticos e conseguir mais semicondutores, a Anfavea estima a produção média de 190 mil veículos/mês no último trimestre do ano, o que leva à previsão de produzir 2,22 milhões de veículos em 2021, em alta de 10% sobre 2020 – fortemente impactado pela pandemia de coronavírus – e 240 mil unidades menor do que a projeção de julho passado, de 2,46 milhões e crescimento de 22%. 

    Se esta estimativa se confirmar, a Anfavea calcula mercado interno total de 2,1 milhões em 2021 (contra 2,3 milhões antes), volume apenas 3% maior que o de 2020, ou 10 pontos porcentuais abaixo do crescimento de 13% previsto em julho.

    Mas o cenário pode ser pior se os fabricantes não conseguirem avançar, apenas mantendo o ritmo atual na média de 169 mil veículos produzidos por mês, fechando 2021 com 2,13 milhões de unidades fabricadas, o que levaria a um mercado doméstico estimado de pouco mais de 2 milhões, resultado quase igual ao de 2020, em queda de 1%. 

    Pode ser ainda pior do que isso? O presidente da Anfavea, Luiz Carlos Moraes, espera que não, pois o cenário mais pessimista já foi traçado com a menor média de produção do ano, indicando que é difícil ficar abaixo disso, embora ele reconheça que a situação é muito instável e não se pode dizer com segurança se o fornecimento de semicondutores permanecerá no nível atual. 

    “Até agora a situação só piorou, não houve melhora. Esperava-se pela normalização do fornecimento de semicondutores até o fim de 2021, mas as últimas projeções já indicam que o primeiro semestre de 2022 continuará desafiador e as melhores estimativas apontam recuperação só no segundo semestre. O que posso garantir é que as montadoras estão trabalhando incansavelmente para alcançar o melhor cenários possível no momento, que é de voltar a produzir neste trimestre volumes parecidos com os do começo do ano”, afirma Moraes.

    Incapacidade de produzir mais freia recuperação

    Durante a divulgação de resultados da indústria na quarta-feira, 6, a exemplo do que já tinham feito os distribuidores autorizados reunidos na Fenabrave, o presidente da Anfavea disse que devido às muitas instabilidades enfrentadas pela indústria “ainda é muito difícil prever o que vai acontecer nos próximos três meses que faltam para fechar 2021”, mas reconheceu que de maneira geral os fabricantes não têm mais condições nem tempo para recuperar a produção já perdida (estimada em cerca de 300 mil unidades no ano) e atender a demanda já contratada pelos concessionários no Brasil, bem como os pedidos das locadoras e também de clientes no exterior, que seguem esperando em filas de 60 a 90 dias para receber os veículos. 

    “Este ano não adianta calcular a demanda para prever a produção, porque temos limitação de oferta. Assim tivemos de fazer o contrário, estimar quanto ainda podemos produzir e assim projetar o tamanho do mercado. As montadoras estão fazendo um trabalho incansável para puxar os números para o cenário mais favorável, mas já sabemos que os resultados de 2021 vão ficar próximos de 2020, o ano de maior impacto da pandemia, e não vamos conseguir recuperar os volumes de 2019”, avalia Luiz Carlos Moraes.

    O impacto da falta de semicondutores e das paralisações de fábricas já afetam o desempenho do mercado brasileiro nos últimos meses. Setembro foi o pior mês do ano, com 155,1 mil veículos novos licenciados, incluindo automóveis, comerciais leves, caminhões e ônibus, resultado 10,2% inferior ao de agosto e 25,3% abaixo do verificado no mesmo mês de 2020. No acumulado de 2021, o total de 1,58 milhão de unidades vendidas indica crescimento de 14,8% sobre o mesmo período do ano passado, mas o porcentual de expansão vem caindo mês a mês por causa da produção abaixo da demanda. 


    > Baixe aqui o arquivo em PDF da Carta da Anfavea de outubro/2021

    > Baixe aqui o arquivo em PDF da apresentação dos resultados da indústria janeiro a setembro/2021


    Observando as variações da produção brasileira, o presidente da Anfavea lembrou que o ritmo das fábricas em 2019 girava acima de 250 mil veículos produzidos por mês, com pico de quase 290 mil em outubro daquele ano. A média caiu para 166 mil/mês em 2020, puxada pela forte queda no segundo trimestre devido ao fechamento de fábricas provocado por medidas para conter a pandemia, mas a partir de agosto voltou a ficar acima de 200 mil unidades/mês, com pico de 238 mil em novembro. Esse avanço estava sendo mantido até maio passado, quando a falta de semicondutores interrompeu ou diminuiu substancialmente a produção, baixando a média mensal para 167 mil veículos nos últimos quatro meses.

    Em ambos os cenários traçados, menos ou mais pessimista, as novas projeções da Anfavea estão pouco abaixo das apresentadas pela Fenabrave no início desta semana. Para Moraes, isso acontece porque a associação dos concessionários “está mais próxima dos clientes” e do desejo de compra, enquanto a entidade que representa os fabricantes tem os olhos voltados “às dificuldades de produção que estão sendo enfrentados pelos associados”. “Mas a diferença é pequena, equivalente a poucos dias de faturamento”, ressalta. 

    Retração econômica só afeta mercado em 2022

    Os problemas na produção são maiores do que o difícil cenário econômico que está sendo desenhado no Brasil com alta da inflação e dos juros, queda da renda e desemprego em níveis recordes. Como as fábricas não estão conseguindo atender a demanda de veículos novos, a retração da economia só deve afetar as vendas do setor a partir de 2022.

    “Por enquanto o mercado está disposto a comprar, com filas de espera por veículos de 60 a 90 dias. Portanto, até o fim do ano esta demanda reprimida ainda deverá ser atendida, mas o volume já está abaixo das previsões que fizemos no início de 2021 e que já eram conservadoras. Em 2022 esperamos ter menos dificuldades com a produção, mas a alta da inflação e dos juros preocupam e poderão afetar as vendas no próximo ano”, avalia Luiz Carlos Moraes.

    O dirigente destaca ainda que nas projeções feitas até agora não está incluído os efeitos da crise hídrica que pode provocar racionamento de energia ou apagões. Se isso acontecer, tudo pode piorar muito. “Estamos monitorando, mas ainda não colocamos nas previsões”, diz. 

    Antes disso, aponta Moraes, ainda há muitos problemas a resolver, como a própria pandemia, que ainda não foi debelada completamente, e suas sequelas econômicas que podem perdurar por anos à frente. “A perspectiva níveis altos de vacinação da população até o fim deste ano reduz o impacto da Covid-19, mas existem sequelas persistem, como é o caso da falta de semicondutores provocada pela pandemia e do enfraquecimento da economia”, resume.