Franklin de Freitas – Muitos pacientes sofrem com as sequelas de Covid-19 mesmo um ano depois

Depois de um ano e meio de pandemia do coronavírus, período no qual os sistemas de saúde por todo o mundo sobreviveram sob intenso estresse enquanto a ciência buscava (e ainda busca) vacinas e possíveis tratamentos para a doença pandêmica, uma luz finalmente parece surgir no túnel da crise sanitária, na medida em que a vacinação avança e o número de pacientes internados e de casos novos de Covid-19 diminui.

O possível fim dessa fase mais aguda da pandemia, no entanto, não representa e não representará o fim dos problemas sanitários. Isso porque, assim como acontece num conflito belicoso, a guerra contra a Covid-19 está deixando uma legião de sequelados, que demandam uma atenção especial do sistema de saúde. E em Curitiba, uma rede de atendimento já vem sendo montada e estruturada, desde o ano passado, para lidar com essa nova demanda.

Até aqui, não se sabe ao certo a quantidade de pessoas que sofrem ou sofrerão com a chamada pós-covid. A Organização Mundial da Saúde (OMS), por exemplo, já apontou que cerca de 10% dos infectados pelo coronavírus (e mesmo pessoas que tiveram quadros assintomáticos) sofreriam com algum sintoma persistente da doença 12 semanas após a infecção, sendo os mais comuns fadiga crônica, dificuldade cognitiva, persistência de dores no corpo e sequelas psicológicas (como transtorno do estresse pós-traumático).

Mais recentemente, uma pesquisa feita pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP) trouxe outros dados aterradores: entre os pacientes que necessitaram de hospitalização, cerca de 70% apresentam algum tipo de sequela um ano depois de terem recebido alta hospitalar. No Paraná, onde 110.838 pessoas haviam sido hospitalizadas por Covid-19 até a última sexta-feira, isso representaria um contingente de aproximadamente 77.500 pessoas com sequelas que persistem um ano após a infecção, afetando seus sistemas nervoso, central, respiratório e/ou cardiovascular, o que demandaria atenção especializada e, não raro, multidisciplinar para sua recuperação.

Da gameterapia a planos terapêuticos
R.F., de 53 anos, teve 25% do pulmão comprometido e enfrenta dificuldade na retomada do ritmo de exercícios de antes. Ele, então, foi a um hospital do Governo Federal vinculado à Rede Ebserh/MEC e, por meio de jogos de videogame que captam movimentos do corpo, encontrou atividades especializadas para recuperar o condicionamento físico.
Essa prática terapêutica, chamada de gameterapia, atua em conjunto com exercícios aeróbicos e de resistência e, dependendo da necessidade do paciente, jogos de diversas modalidades (como tênis, boxe ou boliche) são inseridos na rotina. R.F., por exemplo, intercala o videogame com atividades na bicicleta ergométrica e treinos com halteres e faixas elásticas. “O atendimento é muito bom, me sinto melhor a cada sessão”, afirma.
Outros procedimentos terapêuticos, porém, também podem ser adotados. Foi o que aconteceu com o motoboy F.J.L., de 38 anos, que ficou 29 dias internado (e 17 intubado) após ser diagnosticado com Covid-19. Após receber alta, continuava fraco, sem forças para realizar atividades diárias, e foi encaminhado para um programa de reabilitação pulmonar pós-Covid, com oito semanas de duração e atividades três vezes por semana, sendo duas no Hospital Universitário de Brasília (HUB) e uma em casa, com orientação do fisioterapeuta responsável. O HUB também oferece suporte de oxigênio por cateter nasal para quem ainda depende do oxigênio durante a realização das atividades.

Atendimento multiprofissional é o padrão
Em Curitiba, o Hospital Universitário Cajuru é um dos estabelecimentos de saúde que está atendendo, pelo SUS, pacientes com sequelas da Covid-19. Esse atendimento acontece no ambulatório pós-Covid, localizado no bairro Rebouças, onde os pacientes passam por um exame amplo, para avaliar todas as possíveis sequelas e orientar os tratamentos e terapias adequadas para cada caso, individualmente.
“O paciente passa pela pneumologia e a clínica médica, a fisioterapia faz avaliação funcional, respiratória, a psicologia faz triagem de depressão, ansiedade, estresse pós-traumático, e ele ainda passa pela neuro-psicologia, para fazer testes de função cognitiva, e solicitamos o retorno em três meses”, explica Cristina Baena, pesquisadora do ambulatório.
“É a menor parte, felizmente, que evolui com sequelas, mas em torno de 30 a 40% dos pacientes de ambulatório vão precisar de tratamento especializado”, destaca. Ela aponta ainda que boa parte dos pacientes que chegam ao ambulatório são jovens