Franklin de Freitas

A pandemia de Covid-19 antecipou a desaceleração do crescimento da população paranaense. É o que mostram dados dos cartórios de Registro Civil, os quais revelam que em meio à crise sanitária o número de óbitos no estado teve aumento expressivo, atingindo nível recorde, enquanto os nascimentos minguaram. Como efeito disso, o crescimento vegetativo da população caiu consideravelmente, o que pode gerar impactos diversos no médio e longo prazo.

O levantamento, feito pelo Bem Paraná com base nos dados do Portal da Transparência relativos ao registro civil, revelam que em 2019, antes da pandemia, o Paraná havia registrado 159.327 nascimentos e 73.427 óbitos, o que representa um crescimento vegetativo de 85.900.

Já em 2020, o primeiro ano da crise de Covid-19, houve 148.336 nascimentos e 80.704 falecimentos, com crescimento vegetativo de 67.632 e redução de 21,3% na comparação com o ano anterior.

A situação ainda se agravaria em 2021, quando o Paraná anotou 143.343 nascimentos (menor número considerando a série histórica das Estatísticas do Registro Civil, iniciada em 2003) e bateu o recorde de mortes, com 109.129 óbitos. Com isso, o crescimento vegetativo da população, que chegou a ser de 96.797 em 2005, caiu para 34.124 no ano passado, menor valor para a série histórica.

E quais, afinal, os possíveis impactos desse cenário para o futuro do Paraná?

Em 2018, quando divulgou as “Projeções da População do Brasil e Unidades da Federação por sexo e idade: 2010-2060”, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) estimava que a população paranaense cresceria até 2046, alcançando 12.599.318 habitantes, e a partir dali cairia gradativamente. Com o crescimento vegetativo menor, no entanto, é provável que essa diminuição tenha sido antecipada. Ou seja, o Paraná já deve registrar na próxima década uma redução tanto da população total como da população em idade ativa.

Nacionalmente, por exemplo, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) que a pandemia tenha antecipado em cerca de dez anos a desaceleração do crescimento da mão de obra, o que pode agravar o desequilíbrio dos mecanismos de transferência intergeracionais, tanto em termos de cuidados (já que os pais cuidam dos filhos e depois os filhos cuidam dos pais) como para pagar a conta da Previdência.

Pandemia teve impacto ‘bastante considerável e sem precedentes’
No final do ano passado, um estudo do Centro de Ciências Demográficas Leverhulme, da Universidade de Oxford, no Reino Unido, já apontava para um movimento parecido ao verificado hoje no Brasil em países da Europa e nos Estados Unidos. Na análise, identificou-se que 27 dos 29 países estudados tiveram queda na expectativa de vida para ambos os sexos de 2019 a 2020 (com exceção das mulheres na Finlândia e de homens e mulheres na Dinamarca e na Noruega).

Nos EUA, por exemplo, verificou-se recuo de mais de dois anos na expectativa de vida de homens, num reflexo, principalmente, do aumento da mortalidade em pessoas com mais de 60 anos e às mortes registradas oficialmente por Covid-19. Já na época, os pesquisadores apontavam que em países emergentes de renda baixa e média (como o Brasil) as perdas na expectativa de vida poderiam ser ainda maiores.

Conforme Ridhi Kashyap, professor de demografia social da universidade e um dos autores do estudo, perdas de mais de um ano na expectativa de vida de uma população são incomuns e a pandemia teve um “impacto bastante considerável e sem precedentes” nas taxas de mortalidade e expectativa de vida. Prova disso é que desde a Segunda Guerra Mundial, travada entre 1939 e 1945, a maior parte da Europa Ocidental e os Estados Unidos não registravam um movimento desse tipo.

Expectativa de vida do brasileiro cai 4,4 anos
Em entrevista ao jornal Valor Econômico, a pesquisadora Ana Amelia Camerano, do Ipea, revelou ainda que o brasileiro perdeu alguns anos de expectativa de vida por conta da crise sanitária. Em 2019, por exemplo, uma pessoa nascida no país tinha expectativa de viver, em média, até os 76,6 anos. Hoje, vive cerca de 72,2 anos.

Isso significa, basicamente, entre março de 2020 e dezembro de 2021 o brasileiro perdeu, em média, quatro meses de expectativa de vida a cada mês. Para se ter uma dimensão do que isso representa, entre 1980 e 2019 a população brasileira havia ganhado quatro meses por ano de expectativa de vida.

Na esteira dessa redução da expectativa de vida, a população brasileira também deve começar a cair em breve.

Estimada em 204,6 milhões em 2020, a população brasileira deve ainda crescer e chegar a 212,2 milhões em 2025. A partir de 2030, no entanto, a expectativa é de redução, havendo 209,7 milhões de brasileiros no ano referido e 204,2 milhões já em 2035.