Economia circular: você ainda vai investir nessa ideia 
Preocupações com os impactos ambientais das atividades corporativas motivam desenvolvimento desse modelo 
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Imagem: freepik

Que os novos tempos pedem novas abordagens das empresas em relação aos seus impactos no ambiente é ponto hoje praticamente indiscutível. Essa é a fundação sobre o qual se assentam os fatores ESG (ambientais, sociais e de governança), afinal. Pois a consolidação dessa ideia abre espaço para aspectos mais específicos e práticos dos negócios — o “como” fazer mais com menos, eliminar descartes pós-consumo e usar menos os finitos recursos naturais. Em resumo, trata-se de trocar uma visão linear por uma outra, muito mais razoável e perene: uma perspectiva de fluxo. 

Essa é a base da chamada economia circular, que preconiza a manutenção de todo o ciclo de produção dentro de uma mesma “roda”. A pertinência dessa virada de chave num momento em que está claro que as sociedades não podem mais dar as costas para a maneira equivocada como o ambiente é tratado (está aí a pandemia para mostrar a tragédia que pode surgir de uma relação inadequada com a natureza) já leva os donos do dinheiro a perceber a possibilidade de ganhos. Investir em empresas que levam esses aspectos em conta pode garantir que os ativos preservem valor por um longo prazo. Ao contrário, empresas que menosprezarem a importância dessa agenda tendem a cada vez mais afastar os investidores. 

Dados da Ellen McArthur Foundation, instituição de referência no acompanhamento da economia circular, mostram que a quantidade de fundos de investimento com esse foco aumentou dez vezes de 2016 ao início de 2020. O total de recursos com o direcionamento saltou de 360 milhões de dólares para 2 bilhões de dólares nesse intervalo. 

Green Deal 

Como observou Evy Hambro, global head de investimentos temáticos e setoriais da BlackRock, em entrevista ao portal Citywire, os estímulos econômicos pós-pandemia, como o Green Deal, tendem a ser concentrados nas indústrias verdes e devem beneficiar as empresas que operam num modo circular. Ele fez referência ao plano da União Europeia para reduzir as emissões de carbono e incentivar o crescimento econômico sustentável, cujo nome faz alusão ao programa de reativação da economia dos Estados Unidos pós-Depressão nos anos 1930. 

Mas o que seria exatamente essa roda? A economia circular mimetiza o funcionamento da própria natureza. Basta observar o ciclo de uma floresta. Folhas que caem se decompõem, alimentam as raízes e os micro-organismos sob o solo fazem nascer novas plantas, que crescem e viram refeição para animais que, por sua vez, morrem e também se tornam fertilizante. Essa dança é compassada, não gera resíduos. Assim igualmente pode ser a economia, desde que se encontrem caminhos para os produtos serem aproveitados ao máximo — o que “sobrar” volta para a roda como matéria-prima e o ciclo recomeça. 

Para esse sistema funcionar, um fator é fundamental: uma nova mentalidade em termos de design. Antes da produção, as mercadorias devem ser desenvolvidas de uma forma que permita uma posterior separação de seus componentes para serem reciclados e/ou usados como insumos para outros produtos. O sistema industrial, assim, funciona de maneira integrada e regenerativa, como a floresta. 

O setor de vestuário representa bem a importância do design já desenvolvido com a perspectiva da circularidade. Reciclar roupas e outros itens têxteis é um desafio porque os produtos têm muitas fibras diferentes em sua composição — reciclar algodão não envolve as mesmas técnicas da reciclagem de fios sintéticos. E como em geral as peças têm muitos materiais misturados, quando são descartadas elas inevitavelmente vão parar em lixões ou aterros sanitários, onde demoram anos (até séculos) para se decompor. Nesse setor, portanto, a adesão à economia circular dependeria de um desenho mais inteligente pré-produção, que facilitasse a segregação dos materiais para reciclagem e reaproveitamento. 

Criatividade como ativo 

Como depende de criatividade para resolução de problemas — rapidamente e com baixo custo — a economia circular é terreno fértil para a proliferação de startups, cheias de ideias e jovens empreendedores interessados em ter um planeta para viver no futuro (além dos dividendos que as boas e inéditas sacadas quase sempre rendem). 

Ao redor do mundo, há um sem-número de empresas novatas lançando soluções para colocar os mais variados produtos dentro de um fluxo circular. Elas oferecem desde produtos de limpeza, xampus e condicionadores em tabletes, formato que prescinde de embalagens de plásticos com muitas camadas (eles podem chegar às prateleiras em caixinhas de papelão reciclável ou compostável) até recipientes reutilizáveis feitos com metais resistentes, caso das latas de aço inoxidável para compras de produtos a granel — dá até para encher várias vezes um pote de sorvete Häagen-Dazs respeitando a lógica circular. 

A presença das startups não exclui as grandes companhias, que também investem pesado em pesquisa e desenvolvimento de novos materiais e embalagens. E bons insights igualmente são abundantes. Um exemplo bem interessante é o caso dos pacotes de seis latinhas de cerveja Carlsberg vendidos no Reino Unido. Em vez de as unidades serem envolvidas por uma embalagem de plástico, cada uma recebe um pouco de cola. Grudadas, elas podem ser carregadas pelos consumidores sem dificuldades — a cola pode ser facilmente removida depois.  

A gigante rede de móveis e itens para casa sueca Ikea já experimenta a adesão em larga escala aos processos da economia circular, à qual pretende estar plenamente integrada até 2030. A fabricante de jeans Levi’s vai numa linha diferente: recompra peças que os consumidores não querem mais e as revende num mercado de segunda mão. Se a pandemia não tivesse estragado os planos, os atletas que subissem ao pódio na Olimpíada de Tóquio receberiam medalhas feitas de metais e ligas metálicas (ouro, prata e bronze) recuperados de equipamentos eletrônicos reciclados. 

Faltam indicadores  

Embora motivação, iniciativa e ideias não faltem, a economia circular ainda não entrou para o mainstream da indústria global — ou seja, não é, por enquanto, a dinâmica predominante. Isso talvez explique a relativa escassez de ativos com esse recorte para investimentos, principalmente entre as empresas listadas em bolsa. 

Assim como acontece com o ESG, os investidores não podem contar com indicadores padronizados que permitam uma avaliação precisa das atividades circulares das companhias. Há algumas tentativas, como as da Ellen McArthur Foundation (Circulytics) e os circular transition indicators, do World Business Council for Susteinable Development, mas carecem de companhia. 

Vale, por ora, um trabalho minucioso de seleção. O BGF Circular Economy Fund, da BlackRock, por exemplo (lançado em 2019 e com patrimônio de 900 milhões de dólares), investe em uma empresa norueguesa chamada Tomra, líder mundial em vending machines reversas. Essas máquinas, em vez de venderem bebidas e snacks, compram latinhas de alumínio, pagando diretamente ao consumidor. À mente do leitor que tem mais de 40 anos provavelmente veio a imagem do velho e bom “casco” de bebidas. No fim das contas, as ideias, como a economia, também podem ser circulares. 

 

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