Franklin de Freitas – Pandemia e falta de apoio faz pobreza extrema subir

Desde 2011 o sistema de transporte coletivo de Curitiba sangra, perdendo milhões de passageiros ano a ano. Mas em 2020, com a pandemia do novo coronavírus, o que era até então um sangramento acabou por se tornar uma verdadeira hemorragia, tanto é que os ônibus perderam 62% dos passageiros que transportavam normalmente depois de a crise sanitária se instalar em solo curitibano.

Conforme dados repassados ao Bem Paraná pela urbanização de Curitiba (Urbs), até a metade de março do ano passado, antes da Prefeitura de Curitiba e do Governo do Estado do Paraná decretarem situação de calamidade pública por conta da Covid-19, os ônibus que circulam pela capital paranaense transportava, em média, 767 mil passageiros por dia. Depois da pandemia, contudo, esse número caiu para 289 mil passageiros, um tombo de 62,34%.

Na prática, é como se quase 480 mil passageiros (entre isentos, idosos, estudantes, pessoas com deficiência e aqueles que pagam a tarifa cheia) tivessem deixado de utilizar o serviço público em seu dia a dia.

O tombo foi mais sentido no mês de abril, quando apenas 203 mil passageiros utilizaram o transporte coletivo por dia. Nos meses seguintes, chegou-se a esboçar uma reação, com novembro atingindo a média de 355 mil passageiros transportados diariamente. A partir da segunda metade do penúltimo mês do ano passado, contudo, a crise sanitária voltou a ganhar força e a média de passageiros utilizando o serviço por dia voltou a cair – ficou em 328 mil em dezembro e em 305 mil em janeiro, até o dia 18.

Tais resultados certamente preocupam e colocam questionamentos importantes sobre o futuro do sistema. Entretanto, não são números que chegam exatamente a surpreender.

Primeiro porque o número de passageiros que utilizam o serviço vem caindo consecutivamente ao longo da última década, refletindo a chegada de tecnologias disruptivas e o avanço do mercado de transporte privado individual. Em segundo lugar, porque 93% da população considera arriscado utilizar coletivos e trens em tempos de pandemia, conforme pesquisa feita no final do ano passado pelo Poder Data, em parceria com a Band.

Em outubro do ano passado, inclusive, um relatório do Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR) identificou que diversos ônibus estavam circulando lotados em Curitiba em plena pandemia, num momento em que o distanciamento social é crucial para impedir a disseminação do novo coronavírus. Diante da situação, foi solicitado o reforço da fiscalização do sistema. Ademais, os motoristas também estão instruídos a não parar nos pontos caso o veículo esteja com mais de 50% da lotação.

No próximo mês será decidido o futuro da tarifa

Um dos primeiros desafios do novo mandato de Rafael Greca à frente da Prefeitura de Curitiba será lidar justamente com a questão do transporte público. No dia 1º de fevereiro, por exemplo, é a data-base para o reajuste dos vencimentos pagos aos trabalhadores (motoristas e cobradores de ônibus), item fundamental para a definição do valor da tarifa técnica, uma vez que o item “Pessoal” representa mais de 50% dos custos para a manutenção do sistema, conforme as empresas de ônibus.

Já o dia 26 de fevereiro é a data-base para o reajuste da tarifa técnica na cidade. Pelo lado dos empresários, é de se imaginar que venha a solicitação de um novo reajuste, tendo em vista os prejuízos causados pela pandemia e o possível corte, a partir deste ano, de diversos aportes que o governo estadual vinha fazendo para manter um valor de tarifa mais baixo para os usuários.

A última vez em que o valor cobrado dos passageiros teve reajuste foi em 2019, quando a passagem do usuário passou de R$ 4,25 para R$ 4,50. O problema, porém, é que um aumento da tarifa agora viria num momento em que a população estará com o orçamento apertado pelo fim do auxílio emergencial, desemprego recorde e inflação em alta. Em 2013, foi justamente o reajuste de passagens de ônibus que acabou se tornando o estopim para uma onda de protestos pelo país.

Série histórica aponta para tombo recorde no setor

O número de pagantes vem despencando desde 2011, quando teve início o atual contrato do transporte, depois que as empresas foram selecionadas pela licitação aberta na época. Naquele ano foram 246,89 milhões de passagens pagas, 28,4% a mais do que em 2018. Em 2012 já foram 241,24 milhões de usuários, queda de 2% na comparação com o ano anterior. Em 2013 o número caiu para 239,16 milhões (queda de 0,8%); para 227,04 milhões em 2014 (5%); para 211,78 milhões em 2015 (redução de 7%); para 197,06 milhões em 2016 (queda de 6,6%); para 179,6 milhões em 2017 (queda de 8,9%); para 176,7 milhões em 2018 (-1,61%); e para 171,7 milhões em 2019 (-2,85%).

Em 2020, o número total de passageiros transportados ficou um pouco acima dos 125 milhões. Contudo, diferente dos dados de anos anteriores, que consideram o número de passageiros pagantes equivalentes (PPE), os números de 2020 dizem respeito a todos os passageiros que utilizaram o serviço. Isso significa, basicamente, que o tombo foi ainda maior e mais expressivo do que simplesmente passar de 172 milhões de passageiros para 125 milhões de um para outro ano.

Passageiros transportados por dia em Curitiba, mês a mês

Março*: 766.581
Março**: 280.207
Abril: 203.218
Maio: 243.500
Junho: 264.248
Julho: 249.633
Agosto: 278.985
Setembro: 312.479
Outubro: 348.807
Novembro: 354.468
Dezembro: 327:922
Janeiro: 304.738

* 1º a 14 de março
** 15 a 31 de março

Fonte: Urbs (Urbanização Curitiba)